Amazónia POST

Olá!!! até 18 de Novembro estarei por aqui. Se der vou colocando News e Fotos. Como me disse recentemente (e com razão) um amigo meu "A viagem mais importante que se pode fazer é encontrar amizades pelo caminho". A essas deixo aqui o meu contacto. Kisses & Hugs P.S. Alguns dos textos poderei também por no meu outro blog: http://www.cronicasfm.blogspot.com

Saturday, June 22, 2013

Santa Isabel do Rio Negro (Dias 19 a 25) Completo

6 de Novembro de 2006 - Segunda-feira (dia 19 de viagem)

Acordei mais tarde que os outros dias 7h, já Sta Isabel estava à vista, mas como o barco é lento ainda deu para tomar duche e "pequenalmoçar" antes de atracar.
-Atracar
-trocar contactos com os novos amigos
-Manter os olhos abertos sobre as nossas mochilas. É nestas situações de porto, de carga e descarga e de entrada e saída de pessoas é que podem desaparecer mochilas ou outros pertences.
-E sair do barco.
-De imediato o Ernesto encontrou o Sr. Joaquim, o Tuchaua (chefe) da tribo dos Maku Nadëb, a maioria da tribo estava acampada perto desta cidade, numa ilha do outro lado do rio. Tinham descido o seu rio para vir votar e receber o dinheiro que o governo dá às comunidades indígenas. Como de costume não vale a pena fazer planos. Tínhamos planeado mais seis dias de viagem que afinal não íamos precisar, três de subida para a comunidade deles e mais três de descida do rio no regresso e afinal eles já estavam às nossas portas (ficámos assim com uns dias a mais). O Ernesto combinou ir ao acampamento deles mais tarde nesse mesmo dia.
-Do porto, ou atracadouro, tínhamos ainda que descobrir o caminho para casa da mãe do John Lennon, D. Dulcilene. Pagámos um frete de uma carrinha de caixa aberta, saltámos lá para cima e seguimos. Afinal pagámos 10 Reais para andar de carro apenas dois quarteirõezinhos!!!
A mãe e família do John Lennon, ou Negão como é aqui conhecido, recebeu-nos de braços abertos, como se fossemos da própria família. De uma forma tão pura e boa que não há palavras para descrever!!!
Fomos logo recebidos com um sumo de Açaí fantástico acabado de apanhar no próprio quintal deles. É o fruto roxo de uma palmeira. Ficámos na conversa com a família, que são todos de uma simpatia generosa e genuína, até à hora do almoço. Um almoço fantástico com tudo de bom e delicioso... se for sempre assim vai ser difícil fazer dieta!!!

Depois do almoço descemos até ao centro da povoação para o meu primeiro contacto com os Nadëb, que continuavam agrupados numa pracinha junto ao atracadouro, afastados do resto da população de Santa Isabel, enquanto o seu chefe estava nos correios a tentar receber o dinheiro das pensões.

Eles têm uma língua própria, completamente diferente do que eu já ouvi. Os Maku Nadëb são dos povos índios que menos se misturaram. Desde os primeiros confrontos com o homem branco foram viver para o mais profundo da selva. Hoje em dia já vêm à cidade e apesar de alguns poucos falarem o português falam apenas o indispensável e qualquer outra conversação é apenas entre eles na própria língua. Eles fazem o possível por se manterem à margem do resto da população de Santa Isabel do Rio Negro, tentando interagir o menos possível com estranhos à comunidade deles.
Para chegar à aldeia deles (o Roçado) , coisa que infelizmente já não vou fazer nesta viagem, são três dias de rabeta ou 10 h de voadeira, pouco mais que 200 km, sempre em selva, de um pequeno rio sem qualquer povoação ou habitante ao longo de todo o caminho.
Nota:
Rabeta é uma canoa com um pequeno motor, com pouca potência, que é muito usado nestas paragens.
Voadeira é uma pequena lancha em metal com um motor de popa de 15 ou de 40 cavalos que já andam a velocidades elevadas.

O Ernesto que já tinha vivido com eles 4 meses no Roçado (a aldeia afastada em que eles vivem), falava bem a língua deles, mantendo a conversação toda em Nadëb, reatando velhas amizades, e eu a assistir sem perceber nada. Percebia-se que gostavam dele, querendo saber tudo sobre ele desde que os deixara. O Ernesto tinha sido adoptado por eles apesar de ser mäs (que se pronuncia “manche”) e que quer dizer branco. Enquanto o Ernesto falava com eles na língua Nadëb eles iam-me observando e percebia que iam fazendo perguntas sobre mim, se era casado, se tinha filhos, se tinha fotografias de onde vinha, contou-me depois o Ernesto.
Nessa tarde fomos ao acampamento visitá-los e perguntar se no dia seguinte podíamos ficar com eles no acampamento. Levámos uns refrigerantes como prenda, coisa que eles gostam muito.
Eles vivem uma realidade muito diferente da nossa com uma partilha muito grande em tudo, de tal forma que é muito difícil oferecer uma coisa porque ou oferecemos a todos ou poderá vir a ser um potencial foco de discórdia. O conceito de uns terem e outros não é-lhes estranho. Ou oferecemos algo que possa ser repartido ou que seja para toda a comunidade ou então haverá discórdia à vista e pior, ficamos associados a essa discórdia, deixando de ser bem vindos na comunidade.
Mas ainda sobre eles, a nossa ideia sobre os indígenas é um pouco romântica imaginando-os nus de arco e flecha. Isso já quase não existe, a maioria das comunidades indígenas estão a ser quase totalmente assimilados pela sociedade branca. No entanto ainda se notam diferenças de cultura, tal como as mulheres terem roupa mas põem a maminha de fora para alimentar o bebé em qualquer sítio, sem os pudores e condicionalismos da sociedade "dita civilizada", andando assim dum lado para o outro, de uma forma natural como se nada fosse.
Trouxeram-nos de volta a Santa Isabel.

Quando nos separámos deles o Adaílton, um dos jovens deles, começou a acompanhar-nos calado, a seguir-nos como uma sombra.
Demos umas voltas pela cidade acompanhando a D. Dulcilene nas voltas que ela tinha que dar. Nessa voltas fomos fora da cidade a casa de um rezador peruano que faz uns medicamento com ervas também. Nalguns tratamentos sopram fumo de cigarro sobre os doentes. Dito assim parece estranho mas neste contexto de lendas encantamentos e de Págés (feiticeiros índios) até nos faz sentido e a maioria desses tratamentos parece que resulta.

A seguir demos umas voltas pelas ruas secundárias de Santa Isabel, com casas simples, algumas em madeira. Nessa volta é que me apercebi que a maioria desta população, diria mesmo 90% é índia ou descendente de indio.

Nunca percebemos porquê o Adaílton fez isso mas quando voltámos para o levar ao porto já toda a tribo tinha partido para o acampamento da ilha.
Alugámos uma voadeira (lancha veloz com motor de popa) por 10 reais e lá fomos entregar o Adaílton. O engraçado nisto tudo é que ninguém estava preocupado com ele, nem ele próprio. Nós é que criamos uma noção de preocupação e de responsabilidade que complica a nossa vida de ocidentais.

Entretanto na ilha reparámos que a comida deles já tinha acabado.

Voltámos para jantar com a família onde estávamos hospedados, outra refeição lauta e deliciosa, onde conhecemos a figura do Sr. Raimundo Urubu ou Raimundo Mentiroso, como ele próprio se apresenta.

É um índio de uma outra tribo que vive numa outra reserva, a reserva do bom Jardim, e que frequenta a casa da D. Dulcilene.

Ficámos o serão a ouvir as histórias dele, o maior contador de histórias que já conheci, daí o nome de Raimundo Mentiroso. Contou que em jovem trabalhou para um português, contou lendas e histórias “verídicas”, um pouco exageradas para além de dizer que tinha nascido em 1905 quando aparentava ter apenas uns 70 anos. Mais tarde ficámos bastante admirados quando me disseram que deveria ter quase 90 anos. Fiquei a saber por ele, que os portugueses, contrariamente a outras nacionalidades por aqui, são bem vistos e recebidos pela maioria das comunidades índias.
Fim da conversa e fomos deitar cedo como é hábito aqui.


7 de Novembro de 2006 – Terça feira – (Dia 20 de viagem)

Acordámos cedo como sempre, 7h. Estes cafés da manhã da D. Dulcilene são uma delícia, totalmente diferentes dos nossos mas uma delícia, com ovos, farinha de mandioca, açaí, uns bolinhos crocantes de tapioca, fruta, etc. Eu que julgava que conhecia fruta tropical estava enganado. Há frutas aqui que nem sequer imaginava e que são uma delícia; Tucumã, Açaí, bacaba, Muruxi, acerola, Ingá, etc etc etc.
Dei umas voltas pelo comércio da cidade e ia tirando umas fotos dos personagens que iam passando, e das paisagens do rio, claro.
Outro almoço fantástico da D. Dulcilene a sua casa está sempre cheia de amigos. E nós passámos a ser os seus filhos adoptivos como ela nos chamava. Mais uma vez o “Seu” Raimundo Mentiroso estava lá colorindo o almoço com mais umas histórias exageradas.
Depois do almoço fomos para a ilha e o Ernesto decidiu comprar mantimentos para levar para os indígenas pois a comida deles tinha acabado e a pesca aqui não era fácil. Combinámos rachar a despesa.
Encontrámo-nos com eles e eles carregaram os mantimentos no barco e seguimos para a ilha em que eles tinham montado o acampamento.
Quando lá chegámos já tinham local reservado para o nosso acampamento, na praia, separados deles, ao que o Ernesto disse que ficaríamos mesmo com eles. Eles riram e alegremente carregaram as nossas coisas para um local bem no meio do acampamento deles. Não eram eles que nos segregavam. Eles pensavam é que nós preferíamos não nos misturar com eles.
O facto de termos levado comida para a comunidade acho que ajudou à minha boa recepção por parte deles, mas a razão principal foi mesmo o facto de ser amigo do Ernesto.
Uma coisa curiosa é que na língua deles não há a palavra Obrigado, pelo que receber a comida para toda a comunidade, da nossa parte, quase passou despercebido, mas o reconhecimento depois nota-se em pequenas coisas, amabilidades simples como por exemplo, sem notarmos, aparecem atrás de nós uns pequenos tocos de madeira para nos sentarmos com eles. Nessa noite ficámos sentados com eles à volta da fogueira conversando e ouvindo histórias da tribo, não apanhava tudo porque algumas coisas falavam com o Ernesto na língua deles. O Tuchaua o chefe da tribo, o Sr. Joaquim fala bem o português pelo que as conversas com ele davam para entender, mas era dos poucos. Mais alguns também falam o português mas evitam.
Nessa noite à volta da fogueira foi contada a história do nome deles Maku e a história dos Hupda, outra tribo da raça deles.
Fomos dormir às nove com a sensação de nos estarmos a deitar à uma da manhã. Mas a noite não acabou aqui, uma hora depois começou a chover e um vendaval inacreditável, que nos obrigou a fugir e abrigar e montar as nossa redes dentro da pequena “chapara” barco onde o chefe da tribo dormia. Os jovens correram para nos ajudar a transportar as nossas coisas lá para dentro também.
O barco tinha uns buracos laterais que eram protegidas por uns plásticos amarrados, porém faltava uma amarração. Não tendo nada que pudesse servir para o efeito, tirei a correia de tiracolo da minha máquina fotográfica p+ara servir de amarração. Acho que os tipos da Sony nunca tinha pensado nessa utilidade para essa correia!!! he he!!!
E aí dentro do barco dormimos descansados o resto da noite.
Dormir na rede é um hábito que se adquire depressa!!


8 de Novembro de 2006 – Quarta-feira – (Dia 21 de viagem)

Acordei na chapara já toda a gente estava no café da manhã.
Estavam a beber café feito na fogueira, café que nós tínhamos levado no dia anterior, com um pão tipo roscas secas que eles gostam muito e que nós tínhamos levado também.
Tomámos o banho matinal no rio e ficámos na conversa com o tuchaua Joaquim, ele contou a história que os índios travaram com os mäs (brancos) e que perderam.
Existem no máximo 5 ou 6 canecas que rodam toda a gente à vez para se beber o café. Nós como visitas tínhamos o privilégio de sermos os primeiros a usar as canecas comunitárias.
Nesse dia comecei a ter mais à vontade para começar a tirar fotografias deles. Facilitou o facto da máquina ser digital, porque eles adoram ver o resultado imediato, embora só ainda os jovens se aproximassem para ver.
Às 11 h voltámos para a vila de barco com alguns deles.
Chegámos a casa da D. Dulcilene onde nos espera uma merenda óptima, com bolinhos de tapioca e sumo de Açaí acabado de apanhar (é impossível emagrecer aqui!!!).
Ficámos por casa a molengar e a dormir na rede até ao almoço. Entretanto chegou também para o almoço a figura fantástica do Sr. Raimundo Mentiroso. Tinha trazido peixe seco para o almoço que a D. Dulcilene cozinhou magistralmente (decididamente dieta aqui é para esquecer). O primeiro peixe que comi foi piranha (e eu que julgava que eram elas que nos comiam!!!). Depois provei Pacú, e um outro que não me lembro do nome. Ficámos eté às 15h a ouvir as histórias fantásticas do seu Raimundo Mentiroso (aqui com um personagem como ele por perto a TV é perfeitamente desnecessária). Pediu-me para ir tirar umas fotos deles com a família dele para depois lhe enviar.
-Fotos à família do Raimundo mentiroso.
-Ir ao mercado comprar mais comida para os indígenas, 10 kg de peixe salgado, 25 kg de farinha de mandioca (eles riram-se qd numa refeição eu disse que usávamos farinha de trigo e que quase não usávamos mandioca), muitas bolachas e muito pão.
-Deixámos as coisas na loja para os índios irem lá buscar depois.
-Tivemos que esperar por eles porque tinham ido embora.
-Quando chegámos ao acampamento estavam uma série deles com desarranjos intestinais. Eu que levava o meu kit de emergência de medicamentos homeopáticos, comecei a dar o tratamento aos que se queixavam e quando dei por ela estava uma fila enorme na minha frente à espera de tratamento.
-Durante a tarde fiz um filme com a minha máquina sobre uma das histórias da tribo Maku Nadëd contada pelo Tuchaua. Uma descrição muito vivida porque o tuxaua Joaquim faz a mímica toda da história e personifica todos os personagens. As história vai tendo Nadeb misturado com o português mas dá para entender quase tudo.
No banho da tarde, na praia junto ao acampamento comecei a perguntar aos jovens algumas palavras em Nadeb tendo então começado uma aula muito engraçada com eles a ensinarem-me vocabulário Nadëb, escrevendo na areia e eu apontando num caderno. Eles têm professor próprio e a língua deles já tem escrita. É um pouco estranho porque essa língua deles tem vocalizações que são realmente diferentes, tendo eu dificuldade em escrever em português a forma como as diferentes palavras me soavam.
Mas aprendi algumas palavras tal como:
Hood (praia)
Naëgn (água, que se lê náhêgn)
Nadëb (pessoa, que se lê nádêb)
Mäs (branco, que se lê manche)
Carapee (criança, que se lê cárápêê)
Carapeet’aah (bébé, que se lê cárápêê-táh)
Pahëëu (jovem, que se lê pá-hêê)
Maruus (moça, que se lê maruj), entre muitas outras palavras.
À noite fizemos serão na “chapara” a conversar, o Ernesto, o chefe Joaquim e eu e mais algum pessoal da comunidade. A conversa foi quase surreal, passando por temas como os reis de Portugal, porque e quando a Espanha tinha governado Portugal, se era verdade que o “tuchaua” Saddam Hussein tinha sido condenado à morte e porque é que tinham feito uma coisa dessas com ele.
Aí o Ernesto e eu tentámos dar a melhor resposta possível dizendo que existem várias tribos lá dentro do Iraque, Xiitas, Sunitas e Curdos etc e que o Saddam tinha assassinado milharfes de pessoas da sua própria população incluindo os próprios genros e que agora tinha sido julgado por todos esses crimes. O Joaquim soltou um Ahhh!!! de quem agora percebeu e concorda. Depois perguntou se era verdade que um dos presidentes dos EUA ou da Rússia tinha ameaçado lançar bombas atómicas e qual era a força dessas bombas. Ficou muito admirado qd dissemos que uma só bomba tinha capacidade para destruir toda a cidade como Manaus, apressando-se a traduzir isso em Nadeb para os restantes que assistiam.
Explicámos que nunca chegou a haver guerra porque qualquer do países sabia que lançando a primeira bomba os dois países ficariam destruídos ao que muito a propósito o chefe Joaquim perguntou se não podiam usar essas bombas porque não faziam coisas melhores com esse dinheiro??? E que resposta dar a uma pergunta destas??? Não há!!! Eu e o Ernesto ficámos calados.
Realmente a política ocidental ou mesmo mundial tem aspectos mesmo estúpidos!!!
O jantar foi peixe salgado fervido em água, muito salgado, acompanhado com farinha. Não foi o prato que mais gostei!! Comi, mas pouco, com a desculpa que estava a tentar emagrecer. Na cultura indígena o partilhar da comida e comer juntos é algo importante, e se nos é dado esse privilégio não o devemos recusar, quer gostemos da comida quer não.
Ao recusarmos a comida generosamente oferecida podemos correr o risco de acharem que nos achamos superiores a eles e aí sim cria-se uma barreira depois difícil de transpor.
Entretanto chegou a hora de mais um tratamento, com uma fila grande de membros da tribo “desarranjados”. Ao fim de pouco tempo já estavam a melhorar bastante. Daí começou o meu nome de “Pagé Branco” com que comecei a ser chamado na brincadeira (Pagé é o curandeiro que faz remédios com as plantas e fala com os espíritos).
Voltei para a amena conversa de política mundial à luz de uma parca lamparina na “chapara” do “tuchaua”.
Às 21 h acabou a conversa e fomos para as nossas redes já montadas outra vez no nosso local de acampamento. Não havia qualquer sinal de chuva mas à uma da manhã começou uma chuvada torrencial. O meu sono era tal que eu nem acordava. Teve o Ernesto que me chamar mais que uma vez.
-Acordar sobressaltado
-Recolher a rede com a ajuda dos jovens que vieram a correr para nos ajudar (já me tinham adoptado como amigo deles também)
-Correr de novo para a “chapara”
-Montar rede
-Dormir


9 de Novembro de 2006 – Quinta-feira – (Dia de viagem 22)

-Acordar
-Café da manhã feito na fogueira com o pão seco e as bolachas de água e sal que nós tínhamos levado.
-Um pouco de conversa com o tuchaua
-Banho no rio. Entretanto a minha relação com os Nadeb já era bastante mais próxima, já me pediam para lhes tirar fotografias, brincava com as crianças na praia pegando nelas e atirando-as para longe para mergulharem. Quando os atirava dizia na língua deles 1,2,3 que soa a qualquer coisa como “Chêtê, Paópa, Tánáheube”.
O mais engraçado era quando eu me sentava na areia para ver as fotos na minha máquina, e ficava com uma trupe de crianças empoleiradas de qualquer maneira nas minhas costas, cabeça e ombros, uns 10 miúdos a empurrarem-se para conseguirem ver também. Essa cena era uma foto que eu gostava de ter tirado!! Voltámos à cidade para ir almoçar a casa da D. Dulcilene. Mais uma vez fantástico. A seguir ao almoço o Seu Raimundo Urubu ou Mentiroso passou lá por casa para se despedir de nós. Ia subir o rio para voltar para a comunidade indígena chefiada por ele, A comunidade do Bonjardim, convidando-nos para ir lá visitá-lo. Seriam umas 3 horas de rabeta rio acima mas não iríamos ter tempo.Uma curiosidade que notámos nas refeições em casa da D. Dulcilene foi o facto de para além dos homens não terem que fazer nada em casa, também comem primeiro. Só depois de acabarmos é que as mulheres começavam a comer. Pelos relatos que ouvi do Ernesto, da sua experiência com as comunidades índias, isto é influência clara dos hábitos indígenas enraizados mesmo nos que já vivem na dita “civilização”.
-Passar na internet da escola antes de voltar para o acampamento.
-Voltar para o acampamento, desta vez sem comprar comida para eles porque também o nosso dinheiro tem limites.-Fizemos mais dois filmes com o relato das histórias do povo Maku Nadëb, feito pelo Tuchaua Joaquim.Um acontecimento grande para eles foi o tirar umas fotos deles vestidos com o novo equipamento de futebol (completo) que o Ernesto tinha trazido para eles tendo inclusive mandado imprimir o nome de “Roçado” no peito das camisolas. Estavam doidos de orgulho no seu equipamento. Novos problemas de barriga iam surgindo e eu continuando a fazer de “Pagé”. Nessa noite não se jantou e antes de dormir eu e o Ernesto rachámos uma maçã. Apesar de não termos comprado comida, pagámos o resto da gasolina que eles iam precisar para subir de barco até à comunidade deles. Entretanto nessa noite houve um episódio muito engraçado, antes de me deitar perguntei a um deles, o Sabino, como é que se diziam e escreviam em Nadëb algumas palavras, e aí começaram a juntar-se um a um vários explicadores, os jovens que andavam na escola deles. Entretanto daqui e dali, das redes que estavam espalhadas por ali no escuro iam-se ouvindo correcções dos mais velhos a algumas coisas que os jovens me iam ensinando. Gerou-se uma acesa discussão quando me estavam a ensinar como construir uma frase, porque estavam a ensinar-me com influência da construção frásica do português, ao que os mais velhos entraram logo para repor a forma correcta de construir a frase. Foi uma acesa e animada lição com a participação de todos.


10 de Novembro de 2006 - Sexta-feira - (dia de viagem 23)

-Acordar;
-Café da manha;
Finalmente já não havia casos de problemas de barriga.
Nessa manhã tive uma ideia brilhante, que foi pôr a minha máquina na mão de alguns jovens Nadëb, para fazerem as fotos que quisessem. Já tinha identificado os mais responsáveis a quem poderia confiar essa tarefa... e foi uma festa!!! Consegui com isso fotos de pessoas que não se deixavam fotografar por mim mas que não se importavam de ser fotografados pelos seus, e mais importante consegui fotos de mim pr6prio, muito raras nesta viagem (é um dos problemas de viajar sozinho). Aí quebrou-se todo o gelo que poderia restar, essa manhã foi uma festa fazendo brincadeiras e palhaçadas para a máquina e eles rindo às gargalhadas quando viam um deles com uma cara esquisita ou engraçada nas fotografias que tinham tirado... e a maquina sobreviveu a tudo isso!!! Gravámos também um outra história contada por um dos anciãos, o Pedro Borracha, mas ficou toda em Nadëb pelo que o Ernesto terá que a traduzir mais tarde. E fizeram-se as despedidas. Pela primeira vez ouvimos a palavra obrigado de uma forma clara e sentida, pela comida que levámos para todos eles e pela gasolina que lhes iria permitir voltar para casa. Disseram-me que eu e a minha família seríamos sempre muito bem vindos para ficar na aldeia deles. Que poderíamos ficar uns tempos no Roçado e que queriam que levasse os meus filhos quando os tivesse. Do Ernesto a mesma coisa e mais ainda uma vez que a relação dele com eles e muito mais profunda. Foi uma experiência inesquecível um privilegio a que tenho que agradecer ao Ernesto, ao chefe Joaquim e aos meus novos amigos da tribo Nadeb.
Esta tribo muito dificilmente aceita estranhos no seu seio, mas quando nos consideram amigos e para toda a vida!!! É um conceito um pouco diferente do que estamos habituados, não são como nós que fazemos conhecimentos facilmente e que depois deixamos passar e cair no esquecimento.

Se não voltar cá sei que terei sempre saudades destes meus novos amigos. Em tão pouco tempo deram-me importantes lições de vida ao ensinarem-me a olhar para a vida sob perspectivas diferentes. Sou uma pessoa muito mais rica após este convívio, convívio esse que sei que irei lembrar para sempre!!

-Levaram-nos de volta a Santa Isabel de barco e separámo-nos.Agora sim íamos ficar em casa da D Dulcilene (mãe do John Lennon) nos próximos dias.
Foi um resto de dia calmo e bem alimentado. A minha barriga acusou ainda as refeições com os Nadëb mas nada de grave.
-Internet na escola, para dar notícias;
-Jantar;
-E um gelado num comercio local. As noites aqui são muito quentes!!!
-Ficámos na conversa no alpendre com a família e...
-Dormir


11 de Novembro de 2006 - Sábado - (Dia de viagem 24)

O dia do aniversario da Marisa a irmã da D Dulcilene. Ia haver um grande almoço mas como homens que somos não nos queriam lá para ajudar (nalguns locais, como este, os bons hábitos ainda resistem, he he!!). O facto de querermos ajudar é quase uma ofensa, como se achássemos que elas não estivessem a fazer o trabalho delas como deve ser. E assim a professora Dagmar e o Irmão Eleomar, cunhados da Dulcilene, levaram-nos para a roça dele para passearmos e tomarmos banho num igarapé que existe lá (um igarapé é uma reentrância de rio, com água cristalina neste caso). Nesta roça pudemos ver como trabalham e como fazem a farinha de mandioca entre outras coisas.Chegámos à festa só a tempo de almoçar. Um autentico banquete que durou até à noite. Esta família do John Lennon é muito grande, A mãe D. Dulcilene (nossa mãe adoptiva), o irmão Cristiano (o Jotinha) de 20 anos e o meio irmão (de mãe) o Alberto (o Bola) de 6 anos. Na casa viviam ainda a Avó, a tia Marisa com suas duas filhas, Gabi e Carol de 7 e 4 anos e ainda o filho do John Lennon, o Thomas Anderson de 4 anos que esta a ser criado pela avó. Toda esta família nos recebeu de uma forma incrivelmente boa, como se fizéssemos parte dela há muito. De tal forma que não há palavras para agradecer.
Ainda nesta casa vivem o Dennis e o Cid Clay netos do "Seu" Raimundo Urubu. Presença constante, embora não vivendo lá, são a Professora Dagmar e o Eleumar, irmãos do pai do John Lennon, o Cleomar que já não vive lá. Depois do Jantar fui ainda à escola da Professora Dagmar pôr o este Blog em dia e voltei a tempo de ir com eles ao Bolero. Foi engraçado, o Bolero é um telheiro de colmo ou algo parecido sem paredes com um DJ que vai passando Boleros, Forrós e Shots e que é frequentado pela nata de Santa Isabel, tais como professores, comerciantes e outros ilustres. Ainda dancei um Bolero aceitavelmente (depois de os estar a observar) e fiz uma triste figura no Forró!!! Não consigo acertar com essa dança!!!Voltar para casa e dormir


12 de Novembro de 2006 - Domingo (Dia de viagem 25)

Acordámos com um autentico dilúvio. Imaginem um daqueles temporais de chuva muito pesada só que durante o dia quase todo. À volta da casa ficou uma altura de água entre 5 e 10 cm. Mas isso não impediu outro óptimo café da manha. Depois disso foi um dia para descansar e ficar na rede a dormir sestas seguidas. Durante a chuvada aproveitei para ir à net actualizar este blog.

Entretanto o formigueiro de seguir caminho recomeçou. Não consigo ficar parado muito tempo no mesmo sitio. Falando com o Ernesto decidimos apanhar o Barco do dia seguinte para subir ainda mais o Rio até S. Gabriel, mais 300 km rio acima, serão dois dias e uma noite a dormir outra vez em rede. Terei segunda de manhã, antes do barco chegar que alterar a origem do meu voo de regresso, de Santa Isabel para São Gabriel.

-Jantar
-Fazer a mala mais uma vez.
-E ver, com a família da casa, televisão pela primeira vez em muito tempo.
-Dormir

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